Norueguês ouve a Rádio Cultura Ondas Tropicais a mais de 9 mil km de distância

Utilizando um receptor de rádio, Tore Vik captou os sinais da emissora recém-reinaugurada pela Funtelpa
17/11/2009 – 16:13

Por Carlos Henrique Gondim

Na última sexta-feira (13), o Portal Cultura recebeu um e-mail de um habitante da Noruega, informando que, na noite anterior, havia ouvido a Rádio Cultura do Pará Ondas Tropicais (OT). Com a experiência de quem já ouviu entre 2.000 e 2.500 rádios de todas as partes do mundo, o norueguês Tore Vik se disse impressionado pelo fato de os sinais da Rádio Cultura OT terem atingido o sul da Noruega, a mais de 9.000 km de distância do Brasil.

Aos 71 anos de idade, o oficial aposentado Tore Vik é um DXista (ou dexista) – como são conhecidas as pessoas que têm como hobby ouvir transmissões de rádio oriundas de países distantes do local de recepção, utilizando um receptor de rádio tradicional. A sigla DX, do inglês, traduz-se como “distância X”, ou seja, uma distância desconhecida. Trata-se de um hobby que conquista cada vez menos adeptos, devido, entre outros motivos, à força das novas mídias, que permitem acessar, com maior facilidade e qualidade de som, a uma infinidade de rádios internacionais por meio da internet.

DXista há 57 anos, Tore Vik não fala nem escreve em português. Mas pediu para um que um grande amigo seu, chamado Rudolf Grimm, que mora em São Paulo, traduzisse a carta que enviou ao Portal Cultura. Nela, Tore Vik informa que, no dia 12 de novembro, recebeu os sinais da Rádio Cultura Ondas Tropicais, com um programa de bossa nova.

Tore Vik - Norway

“Sou entusiasta dos assuntos de rádio – mais precisamente por estações de rádio de outros países, que são as minhas favoritas. Gasto um certo número de horas semanalmente para tentar ouvi-las, em noites sem sono e no amanhecer dos dias eu procuro sintonizar a banda de AM (Amplitude Modulada), ondas médias, especialmente procurando ouvir emissoras de países da América Latina”, conta Tore Vik.

A Rádio Cultura OT foi reinaugurada no início de outubro, depois de 11 anos sem transmitir. Para esta nova fase da emissora, foram adquiridos modernos equipamentos, incluindo um transmissor de 10 kW, em um investimento de quase R$ 1,2 milhão, oriundo de uma parceria entre o Governo Estadual, por meio da Funtelpa, e a Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Os equipamentos e o tipo de transmissão utilizado pela OT possibilitam que a rádio seja ouvida em todos os 143 municípios paraenses, e até mesmo outros estados e países.

Em seu e-mail, Tore Vik pediu uma confirmação da Rádio Cultura OT, para se certificar de que a rádio que estava ouvindo se tratava realmente da emissora paraense. “Meu hobby é captar emissoras latino-americanas e eu coleciono as identificações e confirmações das mesmas, as quais ouvi aqui na Noruega. Vivo no sul da Noruega, a cerca de 70 km ao sudeste de Oslo. O distrito onde moro é uma área tipicamente agrícola habitada por fazendeiros. Estou impressionado que os sinais de sua emissora tenham chegado a um local tão afastado, que fica a mais de 9.000 km de distância”, afirma Vik.

Avô de duas crianças, Tore Vik conta, na entrevista a seguir, que seu interesse por rádio começou em 1952, aos 14 anos de idade. Nestes 57 anos como DXista, Tore Vik já perdeu a conta de quantas estações de rádio estrangeiras já ouviu, mas lembra que a emissora latino-americana mais distante que captou foi a rádio Base Esperanza, que funciona na base argentina da Antártida, a região mais inóspita do planeta.

Confira:

Quando começou o seu interesse por ouvir rádios estrangeiras?
Tore Vik – Comecei como DXista em 1952. Antes, preciso fazer um retrospecto. Temos que voltar um pouco no tempo, para abril de 1940, quando as tropas alemãs invadiram a Noruega. Para prevenir que os noruegueses obtivessem informação de fora, todos os receptores de rádio foram confiscados – isso foi na primavera de 1942. Alguns conseguiram esconder seus receptores e continuaram a ouvir. Se você fosse pego com um receptor, a pena poderia ser a morte. Havia transmissões em norueguês em vários países, como Rússia, Inglaterra, Canadá e Estados Unidos – tanto em ondas médias quanto curtas. Então, quando a guerra terminou, em maio de 1945, a fome por informação era grande. Aqueles que tinham um rádio de repente tinham uma grande plateia em suas casas.

Tore Vik - Norway

Estas transmissões continuaram nos anos após a guerra e muitos ouviam a Rádio de Moscou, a BBC de Londres, a CBC de Montreal, a WRUL de Boston e outras transmissões de ondas curtas em inglês de todas as partes do mundo. O objetivo era transmitir as notícias “assim que elas aconteciam”. Logo depois, veio a “guerra fria”, quando a rádio assumiu um papel muito importante, como intermediadora da “verdade real”.

Eu era um dos que se interessaram pelas transmissões vindas de outros países. Aos 14 anos de idade, comecei a ouvir no nosso aparelho de rádio, durante as horas que a Rádio Nacional da Noruega não transmitia. Durante dois anos, eu catava morangos em uma fazenda próxima à minha casa e pude comprar meu próprio rádio. Este hobby ganhou um nome. Eu era um “DXista” (DX significa “desconhecido à distância”).

O que os DXistas faziam?
Tore Vik – Nós escrevíamos para estações de rádio internacionais e informávamos a elas sobre a qualidade de recepção. As informações coletadas eram usadas para corrigir as frequências, antenas e tempo de transmissões. Em troca, nós pegávamos um tipo de verificação de que esta era a estação que nós estávamos ouvindo. Naquele tempo, estas cartas de ouvintes dedicados eram importantes para as estações internacionais. Não apenas pelo aspecto técnico, mas também porque havia alguém lá fora que estava ouvindo. Hoje, não é este o caso, mas nós continuamos a ouvir e enviar informações de ouvintes, com a esperança de uma resposta indicando que era a estação deles que estávamos ouvindo.

Atualmente, as pessoas preferem usar a internet para ouvir rádios estrangeiras, diretamente dos seus websites. Você ainda usa os equipamentos tradicionais, não é? Por quê?
Tore Vik – Neste hobby, você tem que ouvir as ondas de rádio – não via internet. Eu uso um receptor tradicional, mas ele é mais sofisticado do que os receptores comuns que você encontra nas lojas de eletrônicos. Por quê? Humm… Boa pergunta. Acho que tem a ver com o fato de eu gostar de captar os sinais de rádio das ondas com “fades” e barulho.

Que equipamento você usou para ouvir a Rádio Cultura do Pará?
Tore Vik – Usei um receptor produzido pela AOR chamado AR-7030. É um receptor muito bom, feito para DXistas e rádio amadores. Sou DXista desde 1952 e o desenvolvimento mudou as coisas dramaticamente – dos receptores analógicos para digitais, mas os sinais de rádio AM são os mesmos. Eu não estou sozinho. Nos anos 60, havia mais de 10.000 DXistas nos países da Escandinávia. O número, com o passar do tempo, diminuiu para algumas poucas centenas, e a idade média é alta. Existem no Brasil dois ou três clubes de DX. A principal organização é o Clube DX do Brasil (www.ondascurtas.com).

Tore Vik - Norway

Como estava a qualidade do áudio da Rádio Cultura OT?
Tore Vik – Considerando a distância entre o Pará e o Sul da Noruega, a qualidade estava boa. Os sinais de rádio de países muito distantes viajam um longo caminho antes de alcançar a antena do receptor. Não há apenas a distância física entre o transmissor e o receptor, mas também o sinal precisa ser refletido na ionosfera várias vezes. A energia que é induzida na antena é muito pequena e nós usamos receptores adequados para sinais fracos.

Você é um “colecionador de rádios estrangeiras”?
Tore Vik – No início, foi pela informação e para aprender inglês. Hoje, você pode dizer que eu coleciono o som das identificações como ele é recebido aqui e escrevo para as estações de rádio na esperança de que elas venham a verificar se foi a estação de rádio delas que eu recebi.

Por que você escolheu a América Latina, especificamente?
Tore Vik – Pela música. Eu me lembro dos anos quando havia muitas estações de rádio brasileiras em ondas curtas. Eu sentava lá nas últimas semanas de fevereiro ouvindo a música do carnaval de São Paulo e Rio de Janeiro. A primeira estação de rádio brasileira para qual escrevi foi a Rádio Bandeirantes de São Paulo – o ano era 1954.

Quantas rádios você já “colecionou”?
Tore Vik – Já ouvi entre 2.000 e 2.500 estações de radio de todo o mundo.

Quais são as suas rádios favoritas da América Latina?
Tore Vik – A minha área de rádio favorita é o planalto das montanhas dos Andes.

Você já tinha ouvido uma rádio de um país tão distante, quanto a Rádio Cultura do Pará?
Tore Vik – As estações de radio brasileiras são ouvidas regularmente. A rádio mais distante que já ouvi é a Base Esperanza, na Antártida. É uma estação de rádio na base argentina.

Quantas horas por dia você ouve rádio?
Tore Vik – Ouço meu rádio pelo menos duas ou três horas por dia. Às vezes mais, às vezes menos.

Em sua carta, você disse que não fala português. Você consegue entender alguma coisa que é dita no rádio?
Tore Vik – Não, eu não falo nem escrevo em português – mas entendo algumas palavras aqui e ali, mas vocês falam tão rápido que é quase impossível entender. O que eu entendo é quando tem um gol em uma partida de futebol. Acima de tudo, eu gosto de ouvir música – esta é uma língua internacional.

O que você sabe sobre o Brasil?
Tore Vik – Música muito boa – especialmente a bossa nova. Fala-se com frequência sobre a devastação da floresta na região amazônica e como os nativos perdem terreno para os fazendeiros. Também que o Brasil tem uma economia que está crescendo rádio, principalmente na região em torno da costa do sudeste. Também as favelas ao redor das grandes cidades e a alta taxa de criminalidade. Que o Brasil venceu a disputa pelos Jogos Olímpicos de verão – o quê mais? Ah, sim, eu quase esqueci o futebol e que vocês importam bastante bacalhau da Noruega. Eu bebo um copo de suco de laranja toda manhã, de laranjas brasileiras, e café brasileiro.

Qual era a sua profissão antes de se aposentar?
Tore Vik – Fiz um curso de eletrônica no Serviço de Telecomunicações do Exército Norueguês e como engenheiro eletrônico trabalhei no Serviço de Telecomunicações até 1997, quando me aposentei. Terminei como oficial de comando em uma oficina do Exército.

Fonte:

http://www.portalcultura.com.br/?site=1&pag=conteudo&mtxt=12783&cabeca=Noruegu%EAs%20ouve%20a%20R%E1dio%20Cultura%20Ondas%20Tropicais%20a%20mais%20de%209%20mil%20km%20de%20dist%E2ncia

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Engenheiro Eletrônico, trabalha na área de TI e Telecomunicações e é aficcionado por tecnologia, e a prática da radioescuta
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